DECIMAR BIAGINI

DECIMAR BIAGINI
Advogado e Poeta Cruzaltense

Entre em contato com o advogado Decimar Biagini

Nome

E-mail *

Mensagem *

segunda-feira, 7 de julho de 2025

Crônica de um Despertar Fora do Corpo

Crônica de um Despertar Fora do Corpo

 

Em maio de 2021, 26 dias internado, seis mudanças de quarto, noventa por cento de infecção nos pulmões, um livro reiki como filosofia de vida para eventual meditação e orações ecumênicas de parentes, irmãos de antigas crenças, e amigos de todos os cantos do mundo.

Com diabete medicamentosa sem precedentes, glicose em 700, ferritina em 1500, quatro epifanias vendo a própria Nossa Senhora de Fátima me dar alta em vidência futura, morfina e todo tipo de tentação para não retornar em ecstase com entidades harmônicas, iluminadas e entes queridos noutra dimensão, entendi que não era a hora e era preciso mudar meus pensamentos e intenções.

 

Sempre achei que falar da morte era como tentar segurar névoa com as mãos — escapa, se desfaz, e ainda assim permanece ali, rondando. Cresci, como tantos, com essa pequena e teimosa sabedoria humana: acreditar que a morte é o fim, o ponto final da história. Mas foi preciso sair do corpo para entender que, na verdade, ela é só uma vírgula. Um breve respiro entre parágrafos.

 

Minha iniciação como reikiano foi o primeiro sussurro desse outro lado. Energia pelas mãos, calor invisível, a certeza de que somos mais do que carne, mais do que os limites do espelho. Mas foi na travessia silenciosa do COVID, quando o corpo quase desistiu e a alma quase partiu, que compreendi de fato o quanto somos vastos.

 

Não fui embora. Não era hora. Talvez, porque a ideia de partir sozinho, numa sala fria, sem o calor das mãos amadas, me parecia o maior dos exílios. Vi outros indo assim — sós, entubados, cercados por olhares cansados, por medo, por protocolos. E, ironicamente, foi fora do corpo que estive mais próximo deles.

 

Sim, saí. Atravessei paredes como se fossem véus. Flutuei sobre leitos, observei os médicos, as enfermeiras, o vai-e-vem abafado de corredores que muitos nem imaginam. Conversei com outros espíritos, com gente que também pairava ali, à margem entre o agora e o além. Não é história de filme ou sonho mal dormido — é experiência, tão real quanto o toque de uma mão ou o som do coração no peito.

 

E todos, sem exceção, diziam o mesmo: "Não era assim que queríamos ir". Queriam o adeus sereno, o carinho ao lado, a permissão sussurrada: "Pode ir, meu amor, tua missão está cumprida". O medo não é do fim, é da solidão. É da frieza clínica, da falta de poesia no adeus.

 

Voltei. Com essa missão difícil de explicar o inexplicável. De dizer, sem forçar, que a mecânica quântica já cochicha segredos milenares. Que os maiores gênios, laureados de Nobel, já admitem o dedilhar de uma inteligência maior, um sopro criador além da carne.

 

E mais: os pensamentos moldam a cura. Vi cegos de nascença saírem do corpo e descreverem o que nunca viram com olhos terrenos, detalhes verificados que fariam corar de vergonha o ceticismo mais empedernido.

 

Por isso, digo sem titubear: a morte é ilusão para o ego. Quando nos despimos desse medo, abrimos a porta da consciência cósmica. Revemos rostos queridos, reencontramos divindades que sussurram em nossa linguagem interna.

 

O desafio? Ter médicos mais ousados. Menos eutanásia, mais medicina da ternura, do alívio, do cuidado até o último suspiro. Permitir ao outro o ir-se, mas com dignidade, com amor, com as palavras certas: "Vai, cumpriste tua jornada. Aqui, as memórias serão teu altar".

 

Difícil? Muito. Mas é o que posso dizer depois de atravessar o invisível e voltar. Acreditem: nada acaba aqui.

 

Véu se desfaz, luz

a vida escorre no tempo

nada termina.

Nenhum comentário:

Qual tema nos poemas mais te atrai?